03 maio 2014

carta de roma


enquanto trocam de cenário, para a cena em que me revolto contra a paz, escrevo. é meu peito romanesco o liame ante a derrisão súbita, a norteadora adscrição às minhas próprias palavras para lhe acarinhar numa saudade sob a água na qual começo a ser lavado enquanto lhe escrevo uma carta de roma.

essa chuva sutil, brisa em minha língua e logo lava do vendaval que eriça tua nuvem como um bico de seio no céu. você vê que a chuva molhou todos os meus papéis. continuo escrevendo, no entrecenários, enquanto os contra-regras passam por mim, e carregam lanças, escudos, promontórios de gesso; puxam cavalos ou orientam imperadores substitutos e algumas dançarinas de dioniso com as quais contracenarei. seminuas, elas me olham obtusas. não lhe imaginam, mas sabem o quanto existes: porque tuas mãos em meu cabelo estão nos meus gestos, quando verifico a calva dos anos anódinos, e teu cabelo emaranhando o poente vence comigo a praia, desde minha juventude, quando fui motociclista. em minha voz, também estás, quando declino ou aceito o convite para o happye hour da nova trupe, no sarcarmo descolado da contemporary art, caras que não sabem o que significa um relógio de ponteiros no pulso esquerdo. por isso também, chapolim_oficial me acerta no peito, mas eu sobrevivo.

meu desolo que nunca secou por vc ter jogado na praia nossas fotografias é pó saudade; mútua, complexa, sem interpretações. o zero q vazará, várzea úmida. este amor, se alguém cantasse mais do que ninguém. esse, de tão sincero, mais que o silêncio e o grito, descrê uma época da inocência. é quando compreendo que te amo. porque de muitos longes diários da cidade observei tua silhueta, a pele clara de teus abraços de palavras com teus amigos, o senhor da banca de revista, amarildo, mesmo tuas amigas festivas do jogo de vôlei, os primos que lhe admiram, tua amiga silvia, que está feliz, tua irmã flora, pessoa fina, e que lhe é sensível. gente que pouco me sabe, menos ainda os tenho perto, mas cada qual para mim lhe evoca. distante, soprei meu carinho sobre eles, como fosse poeta, e se aparento um descolocado asperger soberbo em minha pouca retribuição aos que me são afetuosos, é por respeitar tua decisão de viajar para longe, assim de meu último bilhete, que não lhe encontrou em teu endereço; e também, confesso, pela causa da lança romana fincada em meu coração, quanto a quebre na ponta do marlboro cinzeiro bar, por sequer ter-me perguntado sobre minha encenação, na feira de variedades circences grotescas municipais, sim, há alguns anos, quando sonhara certo glamour, antes desse novo trabalho.

a chuva agora devasta, sonora. a morosa dor. volteei o bailado cego e som de nuvem na voz. mas longe vejo vir a civilização romana, e visto-me do paramento gaulês, escrevo estas linhas. o diretor conclama aos coadjuvantes, fecho meu moleskine e o celular para entrar nas guerras da gália: sei que não sou julio césar: sou um homem sem qualquer talento para a miopia, ao contrário, meus olhos lhe alcançam sem a minha permissão. (quando a lua tem um olhar triste, delineados olhos com lápis, sorridentes sem qualquer lembrança de mim, mesmo que haja nascente nítido reflexo do jorro de luz que eu lhe faço.)

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