Floração sob a chuva

Os dias nublados o vento joga sobre a praia na paixão de livros misturados no fim do mar. Espero findar o século, fila de ônibus se a dengue e o mosquito me guardam para o atelier de xilogravura: a motocicleta com a plaqueta da bateria colada e eu com as plaquetas baixas somos o hiato de silêncio, limite. Bebendo Gatorade dá pra folhear o livro de Waltercio Caldas, Salas e Abismos, enquanto o soro horrível não poderá ser gelado; ou talvez seja bom deixar o livro de Tchekhov comprado na Rodoviária Novo Rio e ler As ilhas da corrente, de Hemingway. Há um pugilista dentro de mim. Há uma inundação na cidade, dentro de mim tudo é seco, árido. Sinto a sede de um deserto desenhado, pintado com aquarela e tinta acrílica. Chove além da janela. A pedra que faz o Penedo também é lavada por essa chuva feminina, que administra navios e embarcações, pontes e trilhas sonoras quando me faz carinho sem pedir um beijo ao meu rosto roubado. O arvoredo com que a casa dos vizinhos enfeita a minha rua, bem em frente da minha varanda, vezes comenta a verve do vento sul sem lei nem doçura, rasgo de guitarra ou aceno que a região sudeste quem sabe eleve às grandes monções que te levarão meu sonho dentro, forte em ti acarinharão até fazer chorar. Aqui deitado a convalescer do mundo sou outro corpo que cai, Hitchcok Tupi que estirou pernas e braços, cabeceira com livros, entretanto também vôo Hermes alado de asas negras, e na praia nos acenamos sob a chuva; praia nublada que teu sussurro apagará doce, quando voltarei ao horário, na perseverança de esperançoso Paracetamol. Enquanto estou nessa praia, ando de bermuda na areia como se houvesse alguma propaganda da Richard’s na vida ganha sem pechinchar por telefone uma bateria de moto com o Jairo, o dono da oficina que a estripa, de tempos em tempos. De lírio em lírio meu descampado se vem a si até mim que sou eu, e em minha gramática de signos surpreendentes os descrevo em meu caderno, ainda sob a chuva, assim que o comprador do terreno se vai. Anoto aforismas, memórias, casas, verões que nada tem de sua chegada ou partida até anestesiar o que tenho dele em mim, debelações estas que me trouxeram ao erro dos poemas, ao gosto das coisas, ao meu rosto molhado pela chuva, e assim encontro título para esse calhamaço de papeis que se averiguam, misturam, inundam de palavras num jorro enquanto a tarde cai. Depois, trazendo para mais perto de mim essas palavras arredias, começo a esculpir seu carinho, atenção, enigma e semblante, até que esse descampado subitamente emana de si algo de um jardim que havia submerso e toda sua floração que era incógnita me arde pela beleza, me vaza também