08 maio 2007

Narrativas

A nódoa que fica esvai depois o pouco, força o sorriso a mais. Era assim quando nos despedíamos, a voz translúcida de livros, livros que nunca lemos e não pudemos mais colecionar. Para todas as verdades eu tentei desdizer à fórceps teu queixo levantado afim de não admitir que você simplesmente não prestava.

Esqueci teu choro amargurado depois de 4 meses com uma nuca de Ninfa, assim pegando por trás. Esquecimento instantâneo. O que não me livrou, dias depois, de outra mulher. Eu só te digo isso por ter no ouvido a música que esses dias trouxe um Lupicínio em redemoinho igual vingança. Mesmo sem escrever, cansado de ter feito 40, decidi lhe contar, Ana Cristina, o efeito que teve em minha vida essa mulher. Essa que te substituiu.

Nenhuma criatura me confundiu tanto. Acostumado à previsibilidade cotidiana, essa mulher fez louco meu destino anódino. Velhas manias nada significavam, assim como as esparramadas torres com livros de Proust, sobre as quais você me crucificava um corpo, e sentada sobre mim esquecia a mulher politizada, sofrida: de repente nada daquilo tinha acontecido com autenticidade, desejo, cor, e era a anestesia de uma infância iletrada, banal e feminina, um jogo de vôlei. A queima do teu sutian foi um erro, Ana Cristina.

Escrevo para você por pura maldade. Não tenho ambições literárias, sou brasileiro, não poeta. O fato de termos nos encontrado no Shopping apenas afeta a Babilônia dissimulada lá dentro uma dor que você gosta. E tuas sobrancelhas aparadas continuaram católicas, o tempo te comeu bonita já uma década. Você está apenas mais triste, assim como eu. Nós, personagens de romance padecemos o paraíso dos nascidos da ergonomia do narrador, esse homem que goza apenas por si. Estamos condenados por um gênio: sermos fúteis no quanto algo o traumatizou um dia. O que é o temperamento, afinal? O que ele me manda fazer é falar-lhe de Laura.

Não podemos compreendê-lo, talvez ela sim. Como não sou escritor, posso apenas deduzir de onde eles se conhecem, mas não contar-lhes uma estória, inventa-los para nós. Sei apenas perguntar se isso ocorre, se essa mulher que me atravessou o desejo é tão irreal quanto você e eu.

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