21 abril 2008

Rosebud

É um feriado exato e requintado. Luto com nankin contra o tempo, levemente melhor, junto pedaços de idéias, ideais. Estou enfurnado em meu estúdio contra o vento de ventilador que vem até o peito, artefato instalado abaixo da mesa que varre de fora a fora encravada nas paredes. Completamente offline, espero o momento certo pra cutucar de leve, penso em espetar. Vejo claramente o corpo estendido, nu, uma coxa levantada até que a sola do pé descansa no colchão. Meia luz, quarto fechado, quarto de lua. É minha a boca que lambe o ventre, escolhe acima ou ao contrário, até sentir o gosto. Dentro é apertado, quente, molha em silêncio. E depois um ou outro som, até pedir mais, falar mais alto, dizer que pode. É feriado exato. Sem conexão, bar centenário, palmeiras, parque arborizado. E eu ando sem camisa como se tivesse um corpaço, fosse Clark Kent. No entanto, leitor de Ítalo Calvino, esperando o próprio livro; olhando a encadernação de Rainer Maria Rilke, bilíngüe, comprada num sebo de Copacabana numa vez que atravessei o bairro com uma mochila nas costas varrendo todos os antros que conhecia. Olhando a pilha de CDs em que nenhum é meu. Olhando meu rosto, sem espelho, vendo que estou com umas erupções, logo eu que sempre tive a pele inexplicavelmente limpa delas, mesmo adolescente. Diz uma dermatologista amiga que não é alergia, o que me deixa feliz por eu ter um orgulho ridículo de que a alergia respiratória é mais charmosa que a cutânea. Sempre essa fantasia de ser de um score x, sempre sonhando com “as cidades invisíveis”, e esse cabelo solto nas costas magras, que confere um aspecto circense quase acrobático. O melhor no circo é ser palhaço. Os trapezistas têm mais angústia, estão tentando um espetáculo verdadeiro, apontam a dècadence. Os que já entram rindo se dão uma chance.

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